segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Urbanismo islâmico no Castelo de Paderne





Fig 1- Zona interior do Castelo





Decorridas três campanhas de escavações no Castelo de Paderne, foram apresentados alguns resultados referentes ao período islâmico. Esta fortificação de taipa, do extremo sul do Gharb al-Andalus, foi edificada pelos almóadas, mas teve ocupação até ao século XVII. No plano urbanístico, os séculos XII/XIII estão representados por uma cisterna, silos, canalizações,ruas e casas.
A casa mais completa tem 92,66m2, e está localizada no eixo de ruas e organiza-se em oito salas, em torno de um pátio central. Podemos dizer que os compartimentos mais pequenos correspondem a quartos, ou alcovas, depreende se que serviriam para reserva de alimentos, um destes compartimentos tinha um silo.
O espólio que foi apresentado corresponde a uma pequena parte do conjunto, mas é bem ilustrativo da época almóada. A maior parte corresponde a cerâmica comum (vidrada e não vidrada), de uso doméstico, assim como um único vaso policromo, em corda seca. Quanto aos artefactos de metal são de particular relevância as armas, em particular um punhal. Para além destes, apresenta-se também uma chave e um instrumento de osso.



Fig 2- Ceramica Almoada do espolio do Castelo


Apresentação

O castelo de Paderne situa-se na freguesia do mesmo nome, que dista aproximadamente 2,5km para norte, e no Concelho de Albufeira . Está implantado num cabeço, que forma uma península, ladeado pela ribeira de Quarteira,sobre a qual existe uma ponte, cuja origem deve relacionar-se com a do castelo.
Esta forticação islâmica, edificada no período almóada, enquadrava-se num conjunto de castelos que eram o centro de territórios rurais, de pequenas comarcas administrativas.
No exterior das ruínas hoje visíveis, desenvolveu se uma povoação de cariz rural e que corresponderia a uma pequena aldeia (alcaria) que descia em plataforma,sobretudo no lado sul, em direcção à ribeira,e cujos vestígios arqueológicos se encontram escondidos sob o solo actual, resultado dos muitos séculos de abandono.
Totalmente edificado de taipa, este ainda hoje imponente monumento arqueológico do Algarve foi classificado como Imóvel de Interesse Público, por Decreto Lei Nº 516/71 de 22 de Novembro,e é actualmente propriedade do IGESPAR. Este projecto de estudo, restauro e valorização, foi realizado sob a tutela da Direcção Regional de Faro do mesmo Instituto, a direcção científica da parte do projecto respeitante ao estudo arqueológico, esteve a cargo da Dra. Helena Catarino do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra .


Fig 3- Entrada do Castelo com porta em cotovelo





O castelo


Quando nos aproximamos desta fortificação almóada deparamos com a monumentalidade da sua construção, abrangendo uma área de cerca de 3250m2. As muralhas, com espessuras entre 1,90m e 2,10m, assentam directamente na rocha e apresentam base de alvenaria de pedra em alguns tramos, sendo outros logo directamente construídos de taipa.
No exterior nordeste, do lado mais plano do cabeço,sobressai, praticamente intacta, uma torre albarrã,de planta quadrangular, com 5,84m por 5,70m de lado e 9,30m de altura, ligada à muralha por um passadiço superior, que deixa uma passagem inferior, com 2,15 de largura, que dá acesso à porta, em cotovelo, situada no ângulo voltado a nascente.
A falta de outras torres, adossadas às muralhas,pode ser explicada pela própria implantação no terreno,já que este se apresenta em forma de esporão, com declives acentuados, sobretudo nos lados sudeste e noroeste, sendo que o lado sudoeste assenta sobre blocos de afloramento da rocha. O facto de os lados sudeste e sudoeste apresentarem muralhas quebradas, com esquinas reentrantes, que serviam de ângulos de tiro, substitui a necessidade de construção de torres salientes.




Fig4-Arruamentos


Fig5- Cloaca com escoamento para o exterior da muralha



Arruamentos e canalizações



Com as escavações vieram a descoberto os vestígios arqueológicos da ocupação original. O castelo de Paderne revela uma minuciosa planificação de raiz, assim sendo houve a preocupação de fazer coincidir as canalizações principais, dispostas ao longo de ruelas que iriam terminar nas muralhas onde estão localizadas as cloacas de escoamento.
De momento, depreende-se que as quatro ruas já identificadas nas escavações são transversais a um eixo central, que acompanha a crista rochosa e ligaria
a zona da porta até ao sector sudoeste do castelo.
As ruas secundárias, limitadas por casas, são relativamente estreitas (cerca de 1,20m de largura), com pisos de circulação pouco regulares, umas vezes em terra batida, sobre a própria rocha, ou as lajes de cobertura das canalizações (fig. 3. 5). Estas dispõem-se ao longo do eixo da via e são feitas em rebaixamentos na rocha, ou estruturadas com pedras e têm, em média, 0,30m de largura por 0,25/0,30m de profundidade.
Outras canalizações, de características idênticas às anteriores, mas consideradas secundárias, partem do interior de habitações e terminam nas principais, fazendo parte de uma rede organizada de escoamento de águas pluviais e certamente de esgotos,
embora até ao momento não se tenha assinalado nenhuma latrina.
Identificaram-se, porém, duas estruturas negativas, de abertura circular,aparentemente com forma de silos, que poderão ser interpretadas, pela sua localização, como fossas sépticas. Uma, não escavada, está sob uma parede de construções mais tardias, mas entre o exterior de um edifício islâmico e a canalização da rua; a outra situa-se no mesmo eixo de circulação e a sua escavação revelou tratar-se de uma pequena fossa, com canal de comunicação para a canalização
principal.



Fig6- Cisterna junto do templo Cristão


Cisterna e silos

Os reservatórios de água e de cereais são elementos indispensáveis neste tipo de fortificações.
Quanto aos primeiros, o Castelo de Paderne revelou duas cisternas, de épocas e características distintas, hoje parcialmente entulhadas.
A primeira, de época islâmica, localiza-se perto da porta do castelo, na zona onde mais tarde se edificou o templo cristão . É totalmente escavada na rocha, tem 6,25m por 2,70m, de medidas internas e a cobertura é de abóbada. No exterior apresenta um pátio rectangular, sendo o lado mais estreito o que está na zona do bocal de acesso à água. As reservas de cereais estão representadas em quatro silos, de que se escavaram três: dois deles estão nitidamente no interior de estruturas habitacionais islâmicas e os outros estão, aparentemente, numa área de anexos. Pelos materiais arqueológicos identificados no interior, pode se afirmar que estes silos não foram entulhados ao mesmo tempo.




Fig7- Zona intervencionada com vista sobre a ribeira de Algibre




As construções islâmicas

Das áreas intervencionadas resultou a identificação de um conjunto de habitações, Apesar da extensão razoável de intervenção arqueológica, não foi possível analisar todas as edificações islâmicas e suas transformações, no momento subsequente à reconquista, nem definir as plantas das construções da Baixa Idade Média. Se, na zona junto da capela, apenas foram identificados alinhamentos de paredes islâmicas sob algumas das sepulturas do cemitério cristão, também nas duas principais sondagens cresceram depois casas de época moderna.


Fig8- Ossadas do cemitério Cristão junto da capela


O blog do Castelo de Paderne agradece á Dra. Helena Catarino pela sua disponibilidade em fornecer o material necessário a este post


Fig7 Foi gentilmente cedida pela Dra. Leonor Rocha a quem desde já agradeço

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A Arte Islâmica


A arte muçulmana encerra em si um conjunto de manifestações artísticas, correspondentes a diferentes graus de evolução da sua cultura, numa civilização que se expandiu por um vasto território, tendo sido o seu factor de unidade a religião. Desta feita, a arte islâmica em Portugal corresponde a um dado momento da evolução civilizacional muçulmana, interagindo com um povo, cuja cultura era totalmente distinta e, pricipalmente, atendamos, no sector religioso que comandava a vida de ambos os povos: os Árabes e os Portugueses. Este facto é deveras compreensível, até porque os Muçulmanos entraram no nosso território, com o objectivo de invadi-lo e usurpá-lo aos Visigodos (710-716). Apesar da conflitualidade, a arte foi, de certa maneira, bem aceite e facilmente assimilada pelos moçárabes, deixando os seus vestígios e influências. Como se esperava, a arquitectura (religiosa) islâmica, com a “Reconquista”, foi, em grande parte, cristianizada, destruída e profanada, num impulso vingador contra aqueles que o Islão tinha como infiéis.
O fenómeno cultural islâmico caracteriza-se pela sua assimilação, criação e difusão de determinadas formas artísticas. No campo decorativo, basta atendermos à lindíssima escrita árabe, cujos textos originais eram decalcados na íntegra ou por partes nas paredes, pintadas ou ornamentadas com relevos belíssimos. Tanto bastava para a decoração. Ou ainda com azulejos reproduzindo partes de textos ou com motivos geométricos de belíssimas cores .




Vaso de Tavira em ceramica Sec XI, exposto na Casa da Cultura Islamica de Silves


A vida muçulmana é regida por uma certa unidade, cujo factor primordial reside na Religião. No entanto, esta unidade vivencial não viria a fazer sentir-se na sua cultura artística eminentemente homogénea. A vasta área do domínio islâmico que, num ápice, partiu do vasto Oriente a arribou à Península Ibérica, cobrindo todo o Norte de África, foi propício, nas suas várias regiões, a distintas representações formais, de que a nossa Península é um perfeito exemplo. A cultura artística berbere, ao ser difundida pelos invasores, interagia com a tradição local, enriquecendo e alterando as suas próprias formulações de origem. A expansão islâmica noutras culturas tinha como consequência directa a produção da diversidade artística, consoante as suas regiões de implantação. Muito além da sua influência na arte dos povos dominados, outro factor originou a diversidade da cultura artística do Islam. Referimo-nos ao factor proveniente do fundo político-social lá desenvolvido, nas suas numerosas variedades étnicas donde saíram diferentes dinastias e assistiu-se à mudança, ao longo do tempo, dos centros de Cultura, segundo as chefias políticas que promoviam, consoante o seu desejo, certas regiões e a construção artística das mesmas.






Casa do Alentejo em Lisboa




No início, a Arábia não conheceu a arquitectura monumental. Quando os Muçulmanos ocuparam a Síria e o Iraque foram imbuídos pela influência bizantina das dinastias sassânidas nesses territórios, onde emanavam aspectos artísticos do mundo mediterrânico e asiático. A arte islâmica, genericamente, desde os seus primeiros impactos com a civilização, caracterizou-se pelo seu sincretismo, na mistura mais ou menos confusa de doutrinas diferentes e, gradualmente, definiu uma identidade própria, mas com as suas diversidades regionais. Apesar da diversidade formal desta arte, manteve dois aspectos imutáveis: o carácter áulico de uma arte ao serviço do imperium e testemunha do centro urbano onde assenta. A sua arquitectura revelou-se como um foco englobador de outras artes. O edifício, no seu todo, é um verdadeiro suporte da decoração.

Excerto de texto de João Silva de Sousa
Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa
Académico Correspondente da Academia Portuguesa da História


sábado, 21 de maio de 2011

Da janela da minha escola vejo um monumento



Os alunos da Escola EBI/JI de Paderne Turma D 4ª Ano de visita ao Castelo de Paderne


O blog do Castelo de Paderne agradece a utilização do video ao Professor Miguel Cunha

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Conquista de Paderne

Conquista de Paderne



A sul da serra algarvia, estendia-se um mundo que fascinava os conquistadores cristãos, tanto portugueses como do norte da Europa: uma densa rede de castelos, e cidades ricas e populosas. Em 1189, num golpe arriscado, D. Sancho I, em conjunto com uma esquadra de Cruzados, lança-se sobre a cidade mais emblemática da região: Silves. Mas após um breve domínio português sobre o Barlavento, o poderoso Império Almôada iniciou ma reacção fulminante.
Meio século depois, Paio Peres Correia, liderando os Cavaleiros da Ordem de Santiago desencadeou uma série de campanhas que derrubaram o reino muçulmano do Algarve.
Mas a defesa da fronteira havia estimulado aos Almôadas grandes progressos nas técnicas de fortificação. Os califas e os seus representantes na Hispânia promoveram intensas campanhas de construção de fortalezas nos pontos estratégicos. Os maiores investimentos foram para as grandes cidades, como se pode apreciar em Sevilha, Badajoz ou Silves que constituem ainda hoje verdadeiros epítomes da arte da fortificação. Mas não só. Mesmo povoações rurais pouco importantes foram dotadas de pequenos castelos para refúgio em caso de ataque cristão, chamados “albacares”. A divulgação das técnicas norte-africanas de construção em taipa, blocos de terra comprimida aumentou a velocidade de construção sem comprometer a solidez, como testemunham as torres sobreviventes de Paderne, Tavira ou Salir. Desta forma, acreditavam os califas, se impediria o despovoamento muçulmano do al-Andalus.
Os engenheiros almôadas incluíram em Paderne os elementos característicos da fortificação almôada, como a porta em cotovelo, que dificultava a entrada e a passagem de aríetes (antiga máquina de guerra constituída por um forte tronco de freixo ou árvore de madeira resistente, com uma testa de ferro ou de bronze a que se dava em geral a forma da cabeça de carneiro) e máquinas semelhantes. Esta defesa era particularmente eficaz, já que as portas eram habitualmente o ponto fraco de qualquer fortificação, como bem sabiam os cruzados que ficaram desiludidos com “portas de tal forma tortuosas e angulosas que eram mais fácil escalar os muros do que escalar por elas” como demonstra a ilustração.
Quando Paio Peres elegeu como objectivo dos próximos esforços o “castelo forte mui bom” de Paderne, no meio da actual província, o comendador de Alcácer seguiu de novo a “estratégia da aproximação indirecta”.
A escolha do castelo de Paderne justificava-se pela posição deste antigo ribât (mosteiro fortificado), erguido numa elevação que vigiava a estrada que unia Silves às cidades do Sotavento. Caso a fortaleza fosse ocupada, os cavaleiros de Santiago poderiam cortar as comunicações entre o vale do Arade e as cidades do Sotavento e lançar algaras em todas as direcções. Com efeito, o território defendido pelo castelo ia de Albufeira, no litoral, até à Serra. Relativamente a Estômbar ou Alvor, Paderne constituiria não só uma base melhor colocada, como muito mais defensável. Assim, provavelmente em Junho de 1239, os cavaleiros de Santiago partiram da nova base em direcção à vila fortificada de Paderne.
Para o assalto a Paderne, Paio Peres preferiu dirigir-se directamente à fortaleza, contornando Tavira e Loulé sem deixar qualquer força de contenção a vigiar os movimentos destas cidades. Apesar da tentativa de surpreender a guarnição, o ataque fracassou ingloriosamente. Era o primeiro sinal de que, no Sotavento, os espatários encontrariam resistência bem mais decidida e coordenada. De facto, sabendo que os santiaguistas de Paio Peres tinham de sair das bases para as cavalgadas, os muçulmanos tentaram a todo o custo o confronto campal, onde a superioridade numérica fosse decisiva. Tais iniciativas atribuíam-se à convicção dos mouros que deveriam derrotar o mestre de Santiago em campo aberto, quando era mais vulnerável.
A conquista de Tavira concedeu maior liberdade de movimentos às hostes da ordem de Santiago. A partir dessa cidade, foi enviada uma expedição contra Salir, castelo que foi tomado de assalto e ocupado por cristãos, em 1239 ou, menos provavelmente, em 1240. Este pequeno castelo tinha a importância de estar posicionado num ponto de passagem obrigatório de uma das poucas vias que atravessa longitudinalmente o Algarve. Permitia proteger as deslocações entre Tavira e o Oeste contra os mouros de Loulé e Faro. Sempre seguindo a “estratégia da aproximação indirecta”, Paio Peres começa a controlar um extenso território. A base deste controlo era o domínio das fortificações que lhe proporcionavam um meio de pressão sobre as cidades e a vigilância das vias de comunicação.
Os cavaleiros de Santiago dirigiram-se a Paderne, confiando que um cerco em regra teria mais sucesso que o assalto de surpresa anteriormente tentado. Mas a presença em Silves de Aben Mafom, rei do Algarve inspirou ao comendador de Alcácer um estratagema engenhoso. Conhecendo a tendência que os mouros do Algarve vinham manifestando para sair das muralhas quando convictos da superioridade numérica e animados pela perspectiva de uma batalha campal decisiva, D. Paio decidiu forjar uma manobra de diversão. Enviou uma coluna para tomar Estômbar, fazendo crer a todos que a comandava pessoalmente e que seguia nela a maior parte da hoste. A reacção do emir do Algarve foi a esperada: assim que foi informado que o comendador estava em Estômbar, sai de Silves para acorrer ao local, julgando que ia finalmente derrotar o homem que tanto fizera diminuir o reino. Contudo, Paio Peres Correia com a hoste principal levanta subitamente o cerco de Paderne, e desloca-se para Silves onde consegue controlar as muralhas e as portas da cidade. A ocupação de Silves não foi simples, visto que os mouros não se renderam facilmente. O emir, dando-se conta do logro em que caiu, regressa a Silve. Após tentativas baldadas de penetração pela couraça, pelas portas da cidade e pela porta da traição que dava acesso à Alcáçova, desiste do intento, abandona os defensores à sua sorte e foge para norte. A oposição durou até os sarracenos se convencerem da inutilidade da resistência e saberem que D. Paio lhes propunha um acordo aceitável.
Dias depois, o comendador de Alcácer ataca Paderne pela terceira vez e, finalmente, consegue tomar de assalto a tenaz fortaleza. Mas desta vez, Paio Peres mostrou-se menos generoso do que em Silves e fez passar a fio de espada os defensores, como represália pela morte de dois freires de Santiago. O Barlavento algarvio ficava definitivamente dominado pelos cristãos.


A imagem foi gentilmente cedida por Pedro Oliveira Pinto, do seu romance histórico “O Senhor de Paderne”
THE LORD OF PADERNE © Pedro Oliveira Pinto
All rights reserved
http://lordofpaderne.deviantart.com/




Obrigado por tudo Pedro

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Paio Peres Correia

Paio Peres Correia (?-1275)
O herói do Algarve




A lenda atribui-lhe feitos bíblicos.
A História reduziu-lhe as dimensões.

Mas, em qualquer caso, foi um grande guerreiro: conquistou boa parte do Algarve.
Para termos uma ideia da importância e da fama que Paio Peres Correia teve aos olhos das gerações seguintes à sua, bastará recordar algumas das lendas que lhe estão ligadas: dizia-se que, tal como Moisés, também ele fizera brotar água da rocha, para matar a sede aos seus guerreiros; e dizia-se ainda que, tal como Josué, também ele obrigara o Sol a parar no seu percurso para poder derrotar os Mouros numa grande batalha.
Deixando de lado os prodígios bíblicos, diremos que este guerreiro terá dado um auxílio decisivo a dois dos nossos reis, D. Sancho II e D. Afonso III, na conquista do Algarve. O que faz dele, não já um fundador, mas um dos construtores de Portugal. Acrescente-se que a sua acção não teve somente uma dimensão nacional, mas estendeu-se a toda a Hispânia cristã.
Não se conhece a data de nascimento de Paio Peres; tanto pode ter sido em 1205 como num dos últimos anos do século XII. Julga-se que pertencia à família dos senhores da honra de Farelães (região de Barcelos). A sua vida esteve, desde muito cedo, ligada à ordem militar de Santiago. Sabe-se que em 1230 já estava integrado nesta Ordem, implantada tanto em Portugal como em Castela. No seu seio, o jovem guerreiro ganhou importância rapidamente, pois que em 1235 já era comendador de Alcácer ou talvez, mesmo, mestre provincial de Santiago. Nesta qualidade, e à frente da milícia dos espatários (nome dado aos freires de Santiago), auxiliou D. Sancho II na sua conquista (em certos casos, reconquista) do Alentejo: participou na tomada de Aljustrel, que lhe seria doada pelo rei, e provavelmente nas tomadas de Alvalade, Juromenha, Beja e Mértola. Foi, aliás, para Mértola que Paio Peres Correia transferiu a base principal da Ordem portuguesa, que antes estivera em Alcácer do Sal. A vila era, quer para fins defensivos quer para fins ofensivos, um posto de vigilância sobre o Algarve.
Quanto às conquistas algarvias de Paio Peres, pelas quais ele se celebrizou, levantam-nos ainda hoje problemas cronológicos – depois de, na sua época, terem levantado, possivelmente, problemas políticos. Parece bem estabelecido que, após ter-se instalado em Mértola, o chefe dos espatários portugueses se lançou sobre o Algarve, onde se haviam perdido as principais conquistas de D. Sancho I, e tomou aos Mouros Cacela, Ayamonte e Castro Marim. Depois viria a conquistar Estômbar, Alvor, Silves e Tavira. Esta última acção seria, de certa forma, uma represália pela morte de sete cavaleiros portugueses cercados a abatidos pelos Mouros. Ou, pelo menos, é o que conta a tradição. Aqueles sete homens, mortos perto do lugar das Antas, estavam todos ligados a Paio Peres: D. Pedro Pais, Mendo do Valle, Damião Vaz, Álvaro Garcia, Estêvão Vasques, Valério de Ossa, e um mercador, Garcia Rodrigues, que fornecera informações preciosas sobre as movimentações dos Mouros. Os ossos desses sete cavaleiros estão hoje na igreja de Santa Maria do Castelo, em Tavira, em local assinalado por uma lápide que, aliás, conta uma história diferente: terão morrido durante o ataque à cidade, versão que parece mais lógica.




Cavaleiro da Ordem de Santiago




"Correia” com aspas

Paio Peres Correia: este último nome, deveríamos escrevê-lo entre aspas, já que, na época, não era ainda um apelido e sim uma alcunha herdada. Não havia, então, apelidos. O próprio nome “Peres” indica simplesmente que aquele Paio (abreviação vernácula de Pelágio) era filho de um homem chamado Pêro (Pedro).
Como se referiu, “Correia” era uma alcunha herdada – neste caso, ao que se julga, de um bisavô ilustre, Soeiro Pais, que – ao ver-se cercado pelos Mouros no castelo de Montemor-o-Velho, e faltando-lhe provisões, decidiu comer (ele e os seus companheiros, julga-se...) os arreios de couro do seu cavalo e as correias da sua armadura. Daí que passassem a chamar-lhe “o Correia”, para, assinalando a sua acção, o distinguirem de outros Soeiros Pais.
Esta tradição é, pelo menos, plausível, porque muitos apelidos começaram por ser alcunhas devidas ao comportamento ou à aparência de certos homens e passavam depois aos descendentes, até se transformarem no nome distintivo da família.



Marcas duradouras

Não é possível seguir com exactidão os passos de Paio Peres Correia. A sua presença na corte portuguesa está assinalada em 1265, quando serviu de confirmante numa concessão dada pelo rei ao seu chanceler Estêvão Anes. Provavelmente, manteve-se como residente em Castela, mas terá vindo frequentemente a Portugal; em todo o caso, faleceu e foi sepultado em Tentudía (Castela), praça da ordem de Santiago, mas trasladado, no século XVIII, para Tavira, para a mesma igreja onde repousam os “sete cavaleiros”.



Túmulo de Dom Paio Peres Correia



Ossário dos sete cavaleiros de Dom Paio




A memória de Paio Peres Correia não é, hoje, muito viva, pelo menos na consciência da maioria dos portugueses. Mas muitos, sem o saberem, evocam-no constantemente. Por exemplo, ao pronunciarem o nome de Paio Pires, a aldeia do concelho do Seixal, estão a pronunciar também o nome do conquistador do Algarve, que fundou aquela aldeia (como se sabe, “Pires” é somente uma forma de “Peres”).
Outros falarão de Samora Correia – e estarão, também eles, a prestar involuntária e inconsciente homenagem a Paio Peres Correia. Inicialmente, a povoação (situada em terras doadas aos espatários) era apenas “Çamora”. O primeiro documento em que aparece o nome de Samora Correia data de 1300 e a explicação mais lógica é a de que o segundo nome foi acrescentado em homenagem a Paio Peres. Portanto, não foi somente no Algarve que ele deixou marcas duradouras.



Insignia da Ordem de Santiago



As imagens foram gentilmente cedidas por Pedro Oliveira Pinto, do seu romance histórico
“O Senhor de Paderne”
THE LORD OF PADERNE © Pedro Oliveira Pinto
All rights reserved
http://lordofpaderne.deviantart.com/

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Castelo de Paderne vai abrir-se à sociedade


Câmara de Albufeira assina protocolo com direção regional de Cultura para assumir gestão do imóvel

Abrir o castelo de Paderne à fruição pública e à sociedade algarvia é o principal objetivo do protocolo assinado segunda feira entre a câmara municipal de Albufeira e a direção regional de Cultura do Algarve, na presença do secretário de Estado da Cultura. Após muitos anos de negociações, as partes chegaram a um desfecho positivo para desenvolver uma parceria que permita dar mais vida àquele património histórico de caraterísticas únicas no país, erguido em taipa pelos almóadas entre o século XI e o século XII. O acordo assinado, no salão nobre dos paços do concelho, entre a autarquia albufeirense e a direcção regional de Cultura implica a cedência de utilização do imóvel, hoje propriedade do estado, à câmara, para gestão e abertura do castelo à fruição pública. As duas entidades pretendem que a sociedade “o possa utilizar como instrumento de educação, de deleite, de identificação coletiva e de desenvolvimento socio-económico e cultural”. A criação de uma estrutura de acolhimento e apoio, no exterior da área do castelo (um módulo ou contentor, dada a impossibilidade de ali ser construída uma obra, por este se situar em zona de Rene Natura), também é outra das ações previstas no acordo. Este espaço servirá para a receção dos visitantes e para “a divulgação e valorização do monumento e da paisagem cultural envolvente”. O acordo – que prevê ainda a criação de um grupo de acompanhamento – tem a duração de cinco anos, sendo renovado automaticamente pelo mesmo período caso nenhuma das partes não o denuncie. O castelo de Paderne, uma fortificação do período hispano-muçulmano construída com um processo singular, em taipa, depois desativado e abandonado durante séculos, foi classificado, em 1971, como imóvel de interesse público e adquirido, em 1997, pelo estado, que ali procedeu a obras de requalificação, um investimento de 1,5 milhões de euros. “Este protocolo, trabalhado há muito tempo e com caraterísticas muito especiais, permitirá que o monumento de referência no concelho possa ter a utilização que se deve dar àquilo que é recuperado. O pior que se pode fazer é fechar e as pessoas não terem acesso ao património público”, disse Desidério Silva. O presidente da câmara de Albufeira destacou que Paderne tem uma componente importante no contexto cultural do município, sublinhando que o património é uma área “cada vez mais importante e fundamental” na procura de um destino turístico. A diretora regional de Cultura, Dália Paulo, mostrou-se satisfeita por este “processo moroso ter chegado a bom porto”. “Estamos dispostos a devolver o património às pessoas e este caminho será seguido com outros monumentos algarvios, criando sinergias com as respetivas autarquias”, revelou. O secretário de Estado da Cultura, Elísio Summavielle, presidiu à cerimónia realizada segunda feira, onde recordou o papel que também teve neste processo, quando presidia ao então IPPAR – Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico, atualmente IGESPAR. “Este protocolo celebrado entre os poderes central e local é um exemplo do caminho de paciência e de ultrapassagem de obstáculos desde que se iniciou, comigo no IPPAR, há cinco anos”, disse. O governante espera que o castelo de Paderne, pelas suas especificidades, seja “relevado e valorizado”. “Há um caminho muito importante para o futuro deste país: o da valorização do território e do património”, rematou.



Jornalista: Edgar Pires epires@diarionline.pt

Agradeço a foto à Prof. Dra. Leonor Rocha , Universidade de Évora

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Castelo de Paderne - Aquando do restauro das muralhas

Alçado lateral da Capela e a muralha a Norte


«Este castelo é uma jóia». Com esta afirmação, o arquitecto espanhol Manuel Lopez Vicente demonstrava todo o apreço pelo pequeno Castelo de Paderne, cujas obras de conservação e restauro decorreram entre de 2004/05 com a sua assessoria técnica.
Nas obras de restauro e conservação das suas muralhas em taipa militar, recorreram à utilização do material mais abundante na zona, a terra, respeitando assim a técnica original.
Nas obras não foram utilizadas as terras retiradas pelas escavações arqueológicas, o arquitecto explicou que «a terra das escavações continha muitos restos orgânicos, o que lhe alterava a cor e outras características». Por isso, a solução foi misturar «terra do castelo com terra dos arredores».
No restauro foram efectuados ensaios para determinar a composição da taipa militar e concluiram que a composição era a mesma existente noutros castelos da mesma área de influência.

Banco de ensaios

Armação de taipais

As obras começaram pelo lado Sul do castelo, «porque era o que estava mais estragado», com as muralhas literalmente a desfazer-se e a pôr em risco o resto da estrutura referiu o arquitecto Manuel Lopez Vicente.

Inicio dos trabalhos nas fundações do topo Sul

Compactação da taipa

Aspecto geral do lado Sul com andaimes e taipa

Segundo Natércia Magalhães, técnica superior do IGESPAR (antigo IPPAR)de Faro, a ideia foi que «fique o mais parecido possível com a muralha original, embora permitindo reconhecer a intervenção, distinguindo-a do que era a taipa original». A imagem arquitectónica que se pretendia era que subsistisse, em parte, a actual «ruína conservada», impregnada de «cicatrizes» por uma existência histórica com a duração de oito séculos.


Projeção de material aderente no lado Este




Aspecto interior da muralha depois de reparada




Aspecto exterior da muralha depois de reparada


As obras foram realizadas pela firma Stap, que se dedica exclusivamente à reabilitação de construções com uma forte componente de saber e inovação, que procura responder eficazmente às necessidades do mercado na área dos trabalhos especializados de natureza construtiva e estrutural.

www.stap.pt/


Fotos: Maria Fernandes,Arq.
6º Curso de Mestrado em Reabilitação de Arquitectura e Nucleos Urbanos

Texto: http://www.barlavento.pt/index.php/noticia?id=200
Jornalista Elisabete Rodigues



segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Paderne Medieval




Entre os dias 30 de Dezembro e 2 de Janeiro, a freguesia de Paderne voltou a receber o evento Paderne Medieval.
O desafio passou por criar,pelo terceiro ano consecutivo, os tempos de atribuição da Carta Foral a Paderne.
Nobres donzelas, senhores feudais, cavaleiros, condes, duques, membros da Igreja, servos e artesãos desfilaram pelas ruas da povoação, relembrando o espírito medieval vivido no século XIV.
Mais do que uma simples interpretação da história, este evento permitiu aos visitantes viverem um momento único de mistura de gentes, raças, credos, religiões, hábitos e cultura.
A Aldeia histórica de Paderne reviveu os tempos da idade média com desfiles, torneios, exibições, mercado medieval, actuações musicais e muitos outros momentos históricos .